terça-feira, 2 de setembro de 2025

"Pomba Lesa, Feito Boca de Buc3t4!"

Por Belarmino Mariano*

É mesmo uma pomba lesa! Como assim? Alguns dizeres populares que minha mãe usava e nunca entendi direito os motivos e, quando a gente é criança, damos sentidos distintos para as coisas (rsrsrs).

Minha família nuclear era formada por 13 filhos/as, além dos meus pais, ainda tínhamos alguns primos e primas do interior, que viviam conosco, então entre filhos e agregados, facilmente chegava a 18 pessoas numa casa. Aos poucos três irmãos mais velhos migraram para o Sudeste, então a conta de 15 era normal.

Nasci em 1964, tempo dito duro, golpe militar, pressão internacional, guerra fria e família de origem rural. As mães eram raízes, o pilão e o moinho eram instrumentos domésticos essenciais e, quando a coisa estava muito difícil, minha mãe dizia: "isso é o cumunismo do fim do mundo" ou, "a coisa tá russa". E alguns nem acreditam que a ideologia dominante chegasse aos mais isolados lugares.

A minha mãe, Dona Gessi do Bonfim, que Deus a tenha, era leonina, uma mulher de raízes indígenas da Nação Cariri. Pense numa mulher valente e destemida. Pela sua labuta, tenho certeza que foi direto para o Céu.

Era uma pequenininha sem rodeios, braba que só uma ariranha presa num saco de pano. Para ela, a preguiça era o maior dos pecados e quando via coisa desmantelada partia pra cima, sem pena e sem dó.

Sou do tempo de banheiro no fundo do quintal e penico debaixo da rede e, quando a gente "mijava fora do penico", o pau cantava. Agora o pior eram as frases de efeito, ou dizeres que seu rico vocabulário de mãe nordestina não cessava.

De "fi de rapariga", "infiliz das costas ocas", "mucunã rasteira" a "pomba lesa", esses eram os mais leves. Sem esquecer que em um armador de rede, sempre tinha um cinturão velho de couro. 

Tu é doido maluco, pensa que estou de brincadeira!? Se minha mãe pegasse um de nós para exemplo, você não risse não, pois mangar dos irmãos no cinturão, era uma sentença de peia pra você também.

A gente até ria de cara virada, pois enquanto ela tocava o cinto, falava literalmente em línguas estranhas: "cão cocho, magote de fela da gaita, estrupiço, malacabado, cobra cascavel da peste..."

Com minha mãe amada, ninguém brincava em serviço, pois do contrário, "o cancão piava". Se o cabra desse uma de "João sem braço" ou de "abestalhado", ela entrava com a história da "pomba lesa". A minha imaginação ainda não tinha cognição suficiente e, ficava tentando imaginar uma pomba cagando na cabeça de todo mundo.

Deixa quieto, pois a "pomba lesada" que minha mãe falava era muito mais fálica do que penosa. Estava muito mais para "c4r4lh0 de asas" do que para pomba da paz. Se é que me entendem (rsrsrsrs).

Mas ela tinha outro dizer que só fui entender muitos anos depois. Quando a gente queria conseguir uma coisa na facilidade, sem muito esforço, ou quando ela queria resolver um probleminha pra gente, sem receber a ajuda necessária, ela saia com a seguinte frase: "Vocês são como buc3t4, só querem na boquinha!".

Hoje em dia, só uma mãe raiz de verdade, só uma avó com mais de oitenta saberia, interpretar essas frases literalmente. Somos da época em que "c4r4lh0 de asas" e "buc3t4 cabeluda" faziam parte do nosso imaginário coletivo. 

Levando tudo isso em consideração, pensando nos usos e abusos da língua portuguesa, fazendo uma rápida análise de consciência, é importante a gente entender que, vivemos no século 21 e até acreditamos que o mundo acabaria no ano 2000. 

Mas o mundo não acabou e as mães de hoje, com um único filho, as mães de pets, usam novos vocabulários e conseguem até ajudas psicológicas. Você mamãe de hoje, lembra de alguma frase de efeito, que a sua mãe ou avó usava para colocar as coisas em ordem?

*Por Belarmino Mariano. Imagem da rede.

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